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O papel da psicoterapia durante o tratamento oncológico: acolher, escutar e reconstruir

  • Foto do escritor: Tatiana Moita
    Tatiana Moita
  • 16 de abr.
  • 3 min de leitura

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Receber um diagnóstico de câncer é, para a maioria das pessoas, um marco que divide a vida em dois tempos: o antes e o depois. A notícia chega como um abalo, um terremoto emocional que abrange não só o corpo, mas a alma, os vínculos, os projetos e os sentidos da vida. Nesse momento, a psicoterapia se apresenta como um espaço essencial de acolhimento, cuidado e reconstrução.

 

É importante compreender que o processo oncológico não se limita à dimensão física. O tratamento do câncer é também uma travessia emocional, cheia de medos, inseguranças, perdas e ressignificações. Como afirmam Maluf e Brito (2008), o câncer traz consigo um impacto psíquico semelhante ao de situações de crise, exigindo da pessoa a mobilização de recursos internos e externos para lidar com o sofrimento.

 

Entre os muitos aspectos emocionais que emergem nesse processo, podemos destacar o luto pela vida que se tinha. O tratamento impõe mudanças na rotina, na imagem corporal, nos relacionamentos e na própria percepção de si. Muitas vezes, o paciente precisa abrir mão de sua autonomia, do trabalho, das atividades que lhe davam prazer. É um luto silencioso e contínuo, vivido ao longo de todo o processo de tratamento (Kovács, 2008).

 

Neste cenário, a psicoterapia oferece um espaço seguro onde o paciente pode expressar suas angústias, seus medos, sua raiva e até mesmo sua desesperança; sentimentos que, muitas vezes, ele se vê obrigado a esconder da família para “não preocupar”. É nesse espaço que ele pode ser quem é, sem julgamentos. Como ressalta Franco (2003), a escuta terapêutica tem um papel fundamental na reorganização subjetiva da pessoa diante da doença.

 

Mas o sofrimento não atinge apenas quem adoece. Os familiares, amigos e cuidadores, que compõem a rede de apoio, também vivem intensamente esse processo. São eles que, muitas vezes, assumem funções práticas e emocionais diante do tratamento, tentando ser fortes enquanto silenciam suas próprias dores. Por isso, também precisam de apoio psicológico. O acompanhamento terapêutico para a rede de apoio é fundamental para que esses cuidadores aprendam a lidar com seus próprios sentimentos, com a angústia de “não saber como ajudar”, e com os limites reais do que podem oferecer (Debert, 2010).

 

Além disso, é essencial que exista uma comunicação aberta e honesta entre o paciente e sua rede de apoio. Muitas vezes, o desejo de proteger o outro leva ao silêncio, mas esse silêncio pode gerar ainda mais angústia. O paciente tem o direito e a necessidade de dizer como se sente, o que espera, do que precisa, em que momentos quer companhia e em que momentos prefere estar só. Da mesma forma, os familiares podem se beneficiar ao compreender que não precisam “adivinhar” o que fazer, podem perguntar, escutar, aprender junto. A psicoterapia pode atuar também nesse processo de facilitar o diálogo, promovendo vínculos mais autênticos e funcionais.

 

A psicoterapia, portanto, não cura o câncer, mas pode curar outras feridas: a solidão, o medo de não ser mais o mesmo, a angústia diante do futuro incerto. Ela ajuda a resgatar o sentido, a reconhecer as pequenas conquistas de cada dia e a redescobrir uma nova forma de viver. Em muitos casos, o sofrimento se transforma em força, em sabedoria, em capacidade de seguir, mesmo diante do imprevisível.

 

Como psicóloga, afirmo com convicção: a escuta, o acolhimento e o vínculo terapêutico podem ser tão fundamentais quanto o tratamento médico. A saúde emocional é uma parte essencial do cuidado integral, e reconhecer isso é um passo importante no caminho da humanização da oncologia, tanto para quem está em tratamento quanto para quem caminha ao lado.



Referências Bibliográficas

 

DEBERT, Guita Grin. A difícil arte de lidar com a dor e a morte: desafios para os profissionais da saúde. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 25, n. 74, p. 51-62, 2010.

 

FRANCO, Tânia M. Escuta terapêutica: um caminho para a promoção da saúde. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 8, n. 3, p. 73-81, 2003.

 

KOVÁCS, Maria José. Morte e desenvolvimento humano. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008.

 

MALUF, Isabel Maria; BRITO, Jeane Mary de. A experiência da psicoterapia em pacientes com câncer: um estudo clínico-qualitativo. Estudos de Psicologia (Natal), Natal, v. 13, n. 3, p. 207-214, 2008.

 
 
 

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