Luto prolongado: o que é, como funciona e por que precisamos falar sobre ele
- Tatiana Moita
- 30 de abr.
- 4 min de leitura

Perder alguém que amamos é uma das experiências mais difíceis da vida. O luto é o que sentimos quando passamos por uma perda significativa, especialmente quando se trata da morte de alguém querido. Essa vivência pode trazer sentimentos intensos de tristeza, dor, confusão e até mesmo desorganização da rotina. Embora o luto seja um processo natural e esperado, em alguns casos, ele se torna persistente e causa um sofrimento que impede a pessoa de elaborar a perda e seguir com a vida de forma minimamente funcional. Nesses casos, falamos do chamado luto prolongado.
O que é o luto?
O luto é uma resposta complexa e profunda diante de uma perda significativa. Ele é pessoal, único e subjetivo. Cada pessoa vive o luto de um jeito, e não existe uma maneira “certa” ou “errada” de vivenciá-lo. Muitas vezes se fala em “etapas/fases” do luto, como se houvesse um roteiro previsível a seguir, mas a prática clínica e diversos estudos já demonstraram que o luto não segue um padrão fixo de fases. Ele é fluido, e os sentimentos podem ir e vir ao longo da vida.
O luto também não é algo que se supera. A ausência da pessoa amada não desaparece. O que pode acontecer, com o tempo e com apoio adequado, é a elaboração do luto: a construção de um novo modo de se relacionar com a perda, aprendendo a conviver com a dor e a saudade, integrando essa experiência à própria história de vida.
O que é o luto prolongado?
O luto prolongado acontece quando a pessoa encontra muita dificuldade para elaborar a perda e continuar a viver com certo equilíbrio emocional. Trata-se de um luto que se mantém muito intenso e com sofrimento constante por um tempo prolongado, prejudicando a vida cotidiana e os vínculos sociais.
Esse tipo de luto foi reconhecido oficialmente por manuais diagnósticos como o DSM-5-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) e a CID-11 (Classificação Internacional de Doenças) com a nomenclatura de transtorno do luto prolongado. Ele é caracterizado por:
• Saudade intensa e constante;
• Pensamentos recorrentes sobre a pessoa que morreu;
• Incapacidade de reorganizar a vida sem essa pessoa;
• Sensação de vazio ou inutilidade;
• Isolamento e distanciamento social;
• Sofrimento psíquico que não diminui com o tempo.
Esses sintomas devem durar pelo menos 12 meses em adultos (e 6 meses em crianças), causando prejuízos importantes à vida da pessoa.
Por que a nomenclatura mudou?
O termo “luto complicado e/ou patológico” já foi bastante utilizado, mas foi sendo substituído por luto prolongado justamente para evitar interpretações estigmatizantes. Falar em “complicado e/ou patológico” pode soar como uma crítica, como se a pessoa estivesse errando em como sente ou vive sua dor.
A mudança para “luto prolongado” permite uma abordagem mais cuidadosa, respeitosa e técnica, reconhecendo que não é a intensidade do luto que está “errada”, mas sim o sofrimento que permanece bloqueando a possibilidade de continuar a viver de forma minimamente funcional.
Além disso, esse novo nome facilita o diagnóstico clínico e o acesso a tratamentos específicos para quem está vivendo essa experiência tão dolorosa.
O luto prolongado é sinal de fraqueza?
De forma alguma. O luto prolongado não significa que a pessoa está sendo “fraca” ou que “não quer seguir em frente”. Essa condição geralmente está ligada a diversos fatores, como:
• Perdas repentinas ou traumáticas (acidente, suicídio, homicídio);
• Relações muito próximas e dependentes (como entre mãe e filho);
• Históricos de adoecimento emocional ou outras perdas anteriores;
• Falta de suporte emocional e acolhimento após a perda.
Muitas vezes, a dor da perda rompe estruturas emocionais importantes e torna muito difícil dar continuidade à vida cotidiana.
Como se elabora o luto prolongado?
Elaborar o luto não significa esquecer quem partiu ou apagar a dor. Muito pelo contrário. Significa reconhecer essa dor, acolher o que ela representa e encontrar maneiras de seguir vivendo com a ausência. O luto faz parte da vida, mas o luto prolongado pode demandar ajuda profissional.
A psicoterapia é um dos principais recursos para auxiliar nesse processo. O acompanhamento com um profissional da saúde mental pode ajudar a pessoa a reorganizar seus sentimentos, encontrar novas formas de se relacionar com a memória de quem partiu e dar novos significados à sua vida. Em alguns casos, também pode ser necessário apoio psiquiátrico com o uso de medicação para sintomas associados, como insônia, ansiedade intensa ou depressão.
Além disso, algumas atitudes podem ajudar:
• Procurar redes de apoio (amigos, grupos de escuta, familiares sensíveis);
• Cuidar da saúde física como forma de suporte emocional;
• Criar rituais de homenagem à pessoa que partiu (escrever, lembrar com carinho, manter objetos simbólicos);
• Permitir-se viver a dor com verdade e sem pressa.
O luto prolongado tem fim?
O luto em si não tem um fim. Ele não desaparece, mas muda de forma. A dor inicial, intensa e sufocante, pode se transformar com o tempo em saudade, lembrança, presença simbólica. A pessoa que parte continua existindo na memória, no afeto, nas histórias.
No caso do luto prolongado, o objetivo do tratamento não é “curar” ou “acabar” com a dor, mas ajudar a pessoa a encontrar formas mais saudáveis e menos paralisantes de conviver com ela.
Conclusão
Falar sobre o luto prolongado é uma forma de oferecer acolhimento, abrir espaço para escuta e reconhecer que a dor da perda precisa ser respeitada e compreendida, não apressada ou negada. Cada pessoa tem seu tempo e sua maneira de elaborar o luto e isso precisa ser considerado com empatia e cuidado. Quando a dor se torna insuportável e constante, é possível e necessário buscar ajuda. Ninguém precisa passar por isso sozinho.
Referências bibliográficas
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FREITAS, Maristela S. de; MACHADO, Ana Claudia Quintana Arantes. Luto: estudos sobre a perda e o processo de luto na contemporaneidade. São Paulo: Palas Athena, 2019.
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